sexta-feira, 29 de abril de 2011

Padre João Baptista Vaz de Amorim

Por Leonel Salvado

Padre João Baptista Vaz de Amorim | Recursos: Foto: Revista Aquae Flaviae (14) 1995; moldura; http://www.ruadireita.com

A referência moral e intelectual
Sacerdote de origem humilde, recordado por quem o conheceu melhor do que ninguém como «personalidade invulgar» caracterizada pela sua bondade, pela rara vocação cristã, pelo seu inabalável amor à República e pela sua erudição no campo das letras e da investigação histórica e arqueológica, João Baptista Vaz de Amorim, celebrizado na literatura com o pseudónimo de João da Ribeira, nasceu em Vilarinho das Paranheiras, aldeia do concelho de Chaves no dia 6 de Agosto de 1880 onde também veio a falecer, aos 81 anos, no dia 19 de Janeiro de 1962. Este Homem que julgamos ser uma das principais referências morais e intelectuais do seu tempo em Trás-os-Montes e no concelho de Valpaços é mais uma das figuras eleitas para a nossa Galeria de Notáveis do Clube de História de Valpaços.

O estudante
Falecendo seu pai quando João Vaz de Amorim contava apenas dois anos de idade, passou, juntamente com a mãe e a irmã, a viver na residência de seu tio materno, Padre José Caetano de Amorim, em Friões, pároco desta aldeia do concelho de Valpaços, segundo alguns autores[1] ou em S. Julião de Montenegro, segundo outros que dão o mesmo seu tio como sendo pároco desta localidade do concelho de Chaves.[2] Há, contudo, consenso perante o facto de ter sido junto deste sacerdote que Vaz de Amorim fez a instrução elementar ou primária, após o que, segundo Alípio Martins, realizou com sucesso o exame de admissão no liceu em Bragança e fez os primeiros estudos secundários em Valpaços sob orientação de um professor particular. Ainda segundo o mesmo autor, foi encorajado por uma senhora de S. Julião de Montenegro a prosseguir os seus estudos secundários no Colégio de S. Joaquim, em Chaves, antes de se propor no liceu-seminário de Guimarães ao 4.º e o 5.º Anos de Humanidades, em que foi aprovado. Prosseguiu aí, nos dois anos subsequentes, os estudos no ramo das Ciências obtendo também foi aprovação.[3]
Refere Barroso da Fonte que, entretanto, João Vaz de Amorim teria sido convidado pelo Padre Joaquim Marcelino da Fontoura para leccionar no referido Colégio de S. Joaquim, informação que à primeira vista pode parecer pouco condizente com a de Alípio Martins Afonso, o qual faz uma referência à extinção do mesmo colégio que obrigou Vaz de Amorim a regressar à casa da sua patrona, em S. Julião, e continuar aí os seus estudos sob a orientação do respectivo pároco que já havia sido seu professor no extinto colégio. Parece-nos todavia possível que ambos os autores estejam certos pois, dando crédito a um breve mas substancial historial do Colégio flaviense de S. Joaquim publicado no dia 1 de Setembro de 2006 por Fernando Ribeiro no seu blogue “Chaves, Olhares sobre a cidade” e intitulado de “Chaves – o largo do Anjo e o Padre”, confirma-se que, tendo sido fundado pelo mencionado Padre Joaquim Marcelino da Fontoura em 1893/94, a instituição foi de facto extinta no ano de 1896 por decisão do seu próprio fundador em consequência de uma série intrigas que visavam colocar em causa a sua honestidade e o seu desinteresse na gestão da mesma. O Padre Fontoura regressou à sua aldeia natal, Anelhe, concelho de Chaves e aí permaneceu em estado de profunda indignação. Por esta altura Vaz de Amorim contaria 16 anos de Idade e estaria, como referimos, em S. Julião prosseguindo com os seus estudos particulares, antes de ingressar no liceu-seminário de Guimarães. Mas em 1898, ao fim de três anos de insistentes pedidos por parte do Presidente da Câmara de Chaves com a promessa de atribuição de um subsídio de duzentos mil reis, o orgulhoso Padre Joaquim da Fontoura aceitou os pedidos e reabriu o colégio de S. Joaquim «indo instalar-se no Largo do Anjo, na então casa da família Arrochela, actualmente os Serviços Municipais de Águas da Câmara Municipal.»[4] Nesta data, Vaz de Amorim teria concluído o 4.º e 5.º anos dos cursos de Humanidades e de Ciências, sendo razoavelmente credível, e supomos que documentalmente fundamentada, a informação de Barroso da Fonte, voluntaria ou involuntariamente omitida por Alípio Martins Afonso, acerca do convite entretanto dirigido a Amorim para leccionar no renovado colégio pelo respectivo director, colégio que afinal viria a ser definitivamente encerrado em 1907.

O sacerdote
Por ocasião do referido convite, recebido do Padre Joaquim Marcelino da Fontoura, João Vaz de Amorim havia já tomado a decisão de entrar para o Seminário de Braga onde, em 1901, se ordenou sacerdote com a idade de 21 anos. Coube-lhe então, no início do seu múnus paroquiar uma aldeia do concelho de Valpaços, a aldeia de Padrela, segundo Alípio Afonso, ou a de Paradela, também designada por Paradela de Monforte, segundo Barroso da Fonte. Foi no decurso destas funções que recebeu a boa nova da implantação da República em Portugal pela qual revelou desde a sua juventude, em Chaves, uma ardorosa e incessante paixão. Ironicamente, pouco tempo depois decide emigrar para o Brasil onde se diz, impropriamente, que exerceu funções junto do bispo de S. Paulo. Dizemos impropriamente porque, na verdade, este que fora de facto o décimo terceiro bispo da diocese criada naquela cidade, era já então arcebispo e dele sabemos que se chamava D. Duarte Leopoldo da Silva, filho de pai português, e que a ele precisamente se deveu a elevação de S. Paulo a arquidioceses, em 1908, passando a ser, por conseguinte, o seu primeiro arcebispo até à sua morte, em 1938.[5] A decisão tomada pelo Padre João de Amorim tem sido alvo de controvérsia, havendo quem, como Barroso da Fonte, a interprete como consequência do desencanto do pároco perante os excessos de anticlericalismo cometidos pelos republicanos da 1ª República e que resultaram na prisão dos seus colegas. Mas há também quem, como o autor das “Palavras Prévias” publicadas na Revista Aquae Flaviae em edição dedicada ao Padre Amorim, aliás “João da Ribeira”, autor que supomos ser Júlio Montalvão Machado, julgue que a sua precipitada partida para o Brasil fora motivada «por razões pessoais e nunca porque se desse mal com o regime implantado[6] Não tardou o Padre Vaz de Amorim a regressar a Portugal, correspondendo ao pedido de sua mãe nesse sentido, havendo-lhe sido confiada a paróquia de Loivos, no concelho de Chaves, que paroquiou durante 23 anos. Atendido o seu desejo em ser transferido para a paróquia de Bouçoais, aqui se manteve por mais um longo período que tem sido considerado como o mais próspero da sua vida nas áreas da investigação histórica e arqueológica e da produção literária. Mais tarde, segundo Alípio Afonso, regressou à sua terra natal, Vilarinho das Paranheiras, que paroquiou até ao fim da sua vida.

Parecem-nos justas as palavras de homenagem de Alípio Martins Afonso ao Padre João de Amorim «sob duas vertentes: a do literato e de paladino da democracia».


O literato
Dedicado, como por várias vezes referimos, à investigação e à publicação de importantes apontamentos históricos, arqueológicos e até políticos, o Padre Amorim a quem, em virtude da sua paixão pela Arqueologia, a História e Heráldica, nas palavras prévias que lhe são dedicadas no Aquae Flaviae, é considerado como «figura tão rara e sábia como seu Mestre, assim ele chamava o Abade de Baçal»[7], legou-nos uma série de trabalhos repartidos em diversas publicações, tanto durante a sua estada no Brasil como, posteriormente em Portugal:
Ali movido pelo seu amor à Pátria, mas leal como sempre ao ideário republicado democrático, publicou a “Voz de Portugal” e a “Pátria”; em Portugal, na imprensa regional transmontana, e com o pseudónimo de “João da Ribeira” divulgou interessantes apontamentos, como no “Comércio de Chaves” - no qual foram sendo publicados, entre 1939 e 1947 os vários artigos que compõem a sua obra “Por Montes e Vales… Terras de Monforte e Montenegro” - no “Almanaque de Lembranças de Chaves”, no “Mensageiro de Bragança” e no “Vilarrialense”.[8] Segundo Barroso da Fonte publicou também o livro “Pelos Montados da Serra”, não chegando a ser publicado um outro livro que entretanto deixou preparado, intitulado “Coisas da Minha Terra”. Aquele livro, que julgamos ser o mesmo que numa outra fonte surge referido como “pelos Povoados da Serra: aspectos portugueses”com a indicação de que foi publicado em Chaves em 1935, foi o único que o Padre Vaz de Amorim pessoalmente publicou e as razões pelas quais isso sucedeu são reveladas por Alípio Afonso com base na explicação apresentada pela sobrinha do respectivo autor, D. Maria Amorim, de que a modesta vida do tio não comportava os elevados custos de impressão. Também verificámos, através de uma outra fonte, que em 1952, publicou, em Guimarães, um trabalho sobre Arqueologia intitulado”Na Citânia de Briteiros: uma pedra enigmática?”[9]

O paladino da democracia
A convicção político-ideológica democrática republicana, publicamente assumida, pelo Padre João Baptista Vaz de Amorim e a coragem com que se bateu em sua defesa contra a ditadura do Estado Novo, frequentemente evocada pelos seus biógrafos surge claramente corroborada num estudo científico mais abrangente na área da história política em Portugal que tivemos a oportunidade de consultar e que nos serviu de valioso instrumento para o assunto que publicámos aqui no Clube de História, em 31 de Março de 1910 sob o título “Valpacenses na luta contra o Estado Novo”. Da relação que fizemos nesse estudo, intitulado “Candidatos da Oposição à Assembleia Nacional do Estado Novo (1945-1973)” dos candidatos valpacenses, por naturalidade ou afinidade, constatámos com surpresa que João Baptista Vaz de Amorim foi um dos pioneiros dessa mole de transmontanos valpacenses que, destemidamente, tomou a dianteira no alinhamento pela oposição ao regime  ditatorial instituído. Sobre o que dele se dis neste estudo entendemos citar o seguinte excerto:

«Em 1949, foi candidato pela lista organizada em Vila Real e que não foi aceite, sob o pretexto oficial de que não fora possível obter a sua certidão de eleitor, facto que ele mais tarde desmentiria.»[10]

A esta sua longa odisseia na luta contra o Estado Novo, e aos dissabores que dela advieram, também se faz alusão na introdução à edição da Revista Aquae Flaviae em sua memória nos seguintes termos:

«Já com 78 anos, solidário à sua ideia política de sempre, presidiu em Chaves ao jantar de homenagem ao General Humberto Delgado.
Quiseram então um grupo de amigos festejar os seus 80 anos, colocando junto à velha casa de Vilarinho das Paranheiras onde havia nascido, uma lápide de homenagem, penhor de amizade e adoração dos seus conterrâneos e que testemunhasse aos futuros o valor e dignidade daquele homem. Não o consentiu o Governador Civil da época e nada mais foi possível que uma modesta visita de poucos, dos muitos que gostariam de demonstrar-lhe quanto sentiam e admiravam a sua magnífica lição.
Dois anos depois, em 1962, falecia o Padre João Vaz de Amorim.
Só em 1974, livres de quaisquer peias, foi possível, finalmente, colocar essa lápide adiada a realçar publicamente a esplêndida lição desse homem, exemplo de uma vida nobilíssima como sacerdote e erudito, nunca esquecida dos ideais da República.»[11]


As tardias e parcas homenagens
Fica do excerto que acabamos de expor uma ideia das dificuldades com que se depararam um grupo de amigos desta singular personagem quando se propuseram homenageá-lo, ainda em vida, pelos serviços prestados na propagação dos valores cristãos, da cultura e da democracia na própria aldeia onde ele havia nascido. A assinalar a sua grandeza humana existe apenas a referida lápide e uma rua como seu nome na sua terra natal e uma outra em Chaves! Que dizer das aldeias que longamente paroquiou? Resta-nos concluir, com grande mágoa, observando que passados que foram trinta e sete anos de liberdade e de democracia, bem ou mal conduzidos pouco importa para este caso, nada mais foi feito, sobretudo no concelho de Valpaços, no sentido de legar às presentes e futuras gerações um testemunho evocativo da grandeza do Padre João Baptista Vaz de Amorim, como devia, e ainda deve, ser feito acima de tudo como prova de gratidão pela simpatia que ele manifestou e inspirou por estas terras enquanto sacerdote e erudito bem como pela árdua e exemplar luta que travou, enquanto aqui viveu, contra o temível regime ditatorial do Estado Novo.  


Referências
[1] Barroso da Fonte (coordenado por), Dicionário dos mais ilustres Trasmontanos e Alto Durienses, Editora Cidade Berço, Guimarães, Vol I,  1998 | disponível resumo digital:
 http://www.dodouropress.pt/index.asp?idedicao=66&idseccao=553&id=2074&action=noticia
[2] Alípio Martins Afonso, Revista Aquae Flaviae, In Memoriam Pe João Vaz de Amorim,n.º 14, 1995, p. 9.
[3] Ibid., Ibid.
[4] http://chaves.blogs.sapo.pt/33661.html
[5] http://pt.wikipedia.org/wiki/Duarte_Leopoldo_e_Silva
[6] Revista Aquae Flaviae, Id., p. 5
[7] Ibid.
[8] Alípio Martins Afonso, ibid.
[9] Mário Matos e Lemos,  Candidatos da Oposição à Assembleia Nacional do Estado Novo (1945-1973), Divisão de Edições da Assembleia da República e Texto Editores, Lda, 2009, p. 102 | disponível em formato PDF:  http://www.parlamento.pt/ArquivoDocumentacao/Documents/Candidatos_Oposicao.pdf
[10] Ibid., Ibid.
[11] Revista Aquae Flaviae, id.

terça-feira, 26 de abril de 2011

363.º Aniversário do nascimento de D. Pedro II, rei de Portugal

Por Leonel Salvado

Retrato de D. Pedro II, rei de Portugalhttp://pt.wikipedia.org

D. Pedro, nascido a 26 de Abril de 1648, foi o terceiro varão dos sete filhos do rei D. João IV e da rainha Dona Luísa de Gusmão. Posto que o seu irmão primogénito, D. Teodósio, vocacionado para o exercício do poder faleceu aos 19 anos, vítima de uma tuberculose pulmonar, havia ascendido ao trono o segundo varão na ordem de filiação, D. Afonso – Afonso VI de Portugal. O reinado de D. Afonso VI decorreu formalmente entre 1656 e 1683. Efectivamente, só exerceu a prática governativa durante pouco mais de 5 anos por ter sido antecedida, devida à sua menoridade, pela regência de sua mãe até de 28 de Junho de 1662 e interrompida, por insanidade mental e inépcia para a governação e consumação do seu casamento, pela regência de D. Pedro, a 24 de Novembro de 1667.
Após a morte de D. Afonso VI, em 1683, D. Pedro II passou a ser o 24.º monarca de Portugal, o 3º da dinastia de Bragança, e o seu reinado perdurou cerca de 23 anos, até à data da sua morte, aos 58 anos de idade, ocorrida a 9 de Dezembro de 1706 na Quinta de Alcântara ou Palácio de Palhavã, devido a uma apoplexia.
É descrito em documentos coevos como um rei de elevadas qualidades físicas e mentais, exaltando-se-lhe ainda como uma das suas maiores qualidades, dita ironicamente como “um dos seus maiores defeitos”, a sua disposição para ouvir os outros e ver-se esclarecido junto dos seus conselheiros quanto aos mais ínfimos pormenores acerca dos assuntos em discussão.
Empenhado em reconstruir o País, abalado pelas guerras da Restauração, mostrou ser um rei à altura dessa responsabilidade, usando da maior prudência e sensatez que lhe era peculiar. Assim foi pela sua dedicação ao estabelecimento ou reatamento de relações diplomáticas com as cortes europeias que constituíam as principais peças do xadrez político e económico do seu tempo, sobretudo com a Inglaterra mas também com a Espanha que ele restabelecera ainda enquanto Regente em 1668 e em memória de cujo acto se lhe atribuiu o cognome de “O Pacífico”.
Nem por isso deixou de se preocupar com as defesas do Reino que procurou melhorar reforçando as guarnições nas fronteiras, determinando a realização das obras e provimentos que fossem necessários nos castelos das mesmas fronteiras e nos fortes marítimos, bem como no desenvolvimento de frotas para a protecção dos navios da carreira da Índia e do Brasil.
Não descurou também a economia do Reino e as medidas que deviam ser tomadas no sentido de assegurar o controlo do império colonial. Foi nesse sentido que em 1671, por exemplo, concedeu liberdade de comércio aos comerciantes ingleses estabelecidos em Portugal e introduziu no reino as primeiras manufacturas têxteis. Foi também nesse sentido que empreendeu no Brasil um conjunto de reformas na sua organização eclesiástica, bem como no seu ordenamento administrativo e procurou restringir os privilégios dos Jesuítas, cujo poder nos sertões do Norte vinha em crescendo sem que disso tirasse o reino os devidos benefícios. Com a descoberta de ouro no Brasil D. Pedro II intensificou o seu controlo sobre a colónia.
Do seu primeiro casamento com a cunhada, Maria Francisca Isabel de Sabóia, concretizado a 2 de Abril de 1668, confirmada por bula papal a 24 de Março desse ano a anulação do anterior casamento desta princesa de Nemours com D. Afonso VI, teve D. Pedro II uma única filha, a belíssima, Isabel Luísa Josefa de Bragança, “Princesa da Beira”, de saúde frágil e de triste fado, já que viria a falecer aos 21 anos com o epíteto de “a sempre noiva”.  A rainha faleceu a 27 de Dezembro de 1863, três meses depois do seu primeiro marido, vitimada por uma hidropisia. Do segundo casamento com Maria Sofia, condessa palatina de Neuburgo, falecida em Lisboa a 4 de Agosto de 1699, teve D. Pedro II mais seis filhos, o segundo dos quais D. João, futuro D. João V.
D. Pedro II jaz no Panteão dos Braganças, no Mosteiro de S. Vicente de Fora em Lisboa.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

37.º Aniversário da Revolução do 25 de Abril


Edição de 25 de Abril de 1974 em A República, in http://barbeariaideal.blogspot. com | cravos, in http://sindromedeestocolmo.com

Comemora-se hoje em Portugal o fim da ditadura do Estado Novo. É feriado nacional em memória ao movimento revolucionário que em 25 de Abril de 1974 concretizou esse golpe que, desde então e durante décadas, foi entendido como tendo aberto um novo e importante período da História de Portugal representado politica e socialmente o caminho para a instauração da democracia e a conquista da liberdade, razão por que a mesma data tem vindo a ser considerada por muitos portugueses como o “Dia da Liberdade” o qual, todavia não deve ser confundida com o “Dia Mundial da Liberdade” que se comemora a 23 de Janeiro. 
Hoje, face às dificuldades que o país atravessa, esta data parece servir mais como um motivo para reflectir da ingenuidade como foi encarado o futuro pós-revolucionário do que como uma data a comemorar, uma data que cada vez mais suscita a tomada de consciência do desencanto perante a esperança depositada pelos portugueses na "Revolução dos cravo"s, mesmo da parte de alguns portugueses que nela assumiram decisivo protagonismo. Enfim, uma data comemorativa de sabor agridoce mas, ainda assim, uma data de relevância histórica nacional que cumpre assinalar.   
Por ocasião do 37.º Aniversário deste evento histórico, transcrevemos, aqui no Clube de História de Valpaços, um breve resumo histórico deste mesmo evento que intitulámos de “25 de Abril há 36 anos”.
Para rever a publicação referida clique AQUI

sábado, 23 de abril de 2011

Hoje, Dia Mundial de São Jorge e do Escutismo


Neste mesmo dia 23 de Abril, em 2010, assinalámos aqui, no Clube de História de Valpaços, a tradição comemorativa universal deste santo, bem como a sua relação com a instituição do Escutismo, igualmente universal, comemorada na mesma data. Trata-se de um artigo, com o mesmo título em epígrafe, que resume o essencial sobre o significado desta data comemorativa.
Para rever o artigo a que nos referimos clique AQUI.
Para analisar alguns detalhes sobre a vida de S. Jorge e da lenda que lhe está associada clique AQUI.

130.º Aniversário do nascimento de Sacadura Cabral

Em 17 de Junho do ano de 2010 publicámos aqui, no Clube de História de Valpaços,  um texto em homenagem à “Primeira travessia aérea do Atlântico Sul”, que, como se sabe, foi uma das mais destacadas proezas deste grande pioneiro da aviação mundial, em parceria com Gago Coutinho. Nesta publicação tivemos a preocupação de divulgar também dois resumos biográficos relativos aos mesmos protagonistas pelo que remetemos os nossos leitores, nesta data comemorativa do nascimento de Sacadura Cabral, para essa nossa publicação.

Para consultar a referida publicação clique AQUI.
Para conhecer mais detalhes sobre a mesma figura comemorativa clique AQUI ou/e AQUI.

As “Alminhas” do concelho de Valpaços: freguesia de Santa Valha

Por Leonel Salvado
Tema: Citações de autores de blogues locais sobre “Alminhas” | Objecto: Covilhete | Criação digital: Leonel Salvado | Outros recursos: http://www.iromababy.com (fundo superior);   http://www.planetasercomtel.com.br (fundo inferior).
(clique sobre a imagem para aumentar)

É tempo de fazermos aqui, tal como temos vindo a fazer em relação aos Cruzeiros e às Fontes e Chafarizes, a divulgação desta outra área do nosso Património Arquitectónico Religioso do domínio da tradicional da espiritualidade popular (para que, embora já não seja o que era, nunca despareça!) que é o das “Alminhas” do concelho de Valpaços. Encontrámos a seguinte nota curiosa a respeito de tipo monumentos muito numerosos no distrito de Vila Real:



«"Alminhas" são painéis pintados pelo povo, com orações para a libertação das almas.   Existem dois grupos de "Alminhas": um é, em geral, para as almas do Purgatório, e a outra é principalmente para as vítimas de morte violenta ("Alminhas" que foram assassinados, etc). Encontramos pinturas de "Alminhas" [em] cruzes, nichos, oratórios, caixas de dinheiro da igreja, em bandeiras utilizadas em procissões, capelas, etc

In Alminhas de Vila Real, http://en.lifecooler.com/lifecooleren/alminhas-of-vila-real-handicraft-296743-1.html

Acrescenta A. Veloso Martins na sua muito credenciada Monografia de Valpaços a propósito das Alminhas:

« É o termo empregado pelo povo e divulgado já pelos eruditos. [...] 
A tradição das "alminhas" ou nichos vem do fundo dos séculos e deverá ser mantida como cousa fecunda e actuante em prol da espiritualidade pura do povo. [...] Em regra o painel das almas é pintado em tábuas de madeira, ou azulejos e representa pessoas - os pecadores - a debaterem-se entre labaredas.
Na composição da pintura como motivo central, aparece Cristo crucificado, a Santíssima Trindade, o Padre Eterno, a Virgem, esta nas invocações de Nossa Senhora do Carmo, do Rosário, do Alívio, das Dores, entrando ainda como figuras acessórias os Santos e os Anjos.
As almas são normalmente figuradas como bustos humanos de adultos - as inocentes crianças não vão para o purgatório - de ambos os sexos de todas as categorias e profissões, distinguindo-se pelo comprimento dos cabelos, as almas femininas, pelas barbas brancas, os anciãos, pelas coroas os reis, pelas mitras os bispos, e pelos próprios hábitos os padres, frades, e freiras, todos envolvidos por chamas alterosas, em atitudes de súplica, desespero, ou esperança, muitas vezes de mãos postas. É frequente também aparecer como figura central S. Miguel Arcanjo, estendendo a balança e segurando o gládio, símbolos de inexorável justiça. Quem passa, descobre-se, deixa a esmola e reza
A. Veloso Martins, Valpaços, monografia, 1990, p.365


É a divulgação desta admirável forma de arte popular que nos propomos levar a cabo através desta nova concepção visual que estreámos para as “fontes e chafarizes” e para a nossa “homenagem às Sete Maravilhas do Concelho de Valpaços” – o efeito visual dos objectos cerâmicos. Para as “Alminhas” criámos uma forma de covilhete de louça muito comum na faiança portuguesa para servir de suporte à iconografia – as fotos são, neste caso, as que foram publicadas pela Junta de Freguesia de Santa Valha.


I

Tema: Um dos monumentos de “Alminhas” de Santa Valha | Foto base: http://www.santavalha.com | Objecto: Covilhete | Criação digital: Leonel Salvado | Outros recursos: http://www.iromababy.com (fundo superior); http://www.planetasercomtel.com.br (fundo inferior).
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II

Tema: “Alminhas” do Sr. Dos Aflitos, Pardelinha, Santa Valha | Foto base: http://www.santavalha.com | Objecto: Covilhete | Criação digital: Leonel Salvado | Outros recursos: http://www.iromababy.com (fundo superior); http://www.planetasercomtel.com.br (fundo inferior).
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III

Tema: “Alminhas” de Corgoço, Santa Valha | Foto base: http://www.santavalha.com | Objecto: Covilhete | Criação digital: Leonel Salvado | Outros recursos: http://www.iromababy.com (fundo superior); http://www.planetasercomtel.com.br (fundo inferior).
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quarta-feira, 20 de abril de 2011

Um ilustre valpacense a resgatar para a História

Actualizado por Leonel Salvado em 30.09.2012

Miguel Francisco Fernandes Machado | Foto de José António Soares da Silva,
 in Traição de Valpaços ou Traição a Valpaços| Arranjo digital de Leonel Salvado

Miguel Francisco Fernandes Machado não consta, estranhamente, no “Dicionário dos mais Ilustres Transmontanos e Alto durienses”, uma obra composta por três volumes e coordenada por Barroso da Fonte que se apresenta como um importante repositório biográfico das figuras que atingiram pródiga celebridade no contexto regional a que se reporta e se propõe ser também uma obra evocativa dos singulares valores dessas figuras.
Estranhamente, dissemos, já que “Miguel de Fiães”, como ficou popularmente conhecido por ser natural desta freguesia do concelho Valpaços, surge retratado por vários autores, designadamente pelo Padre João Vaz de Amorim numa das suas publicações na “Revista Aquae Flaviae” e, mais recentemente reafirmado pelo Dr. José António Soares da Silva em “Traição de Valpaços ou Traição a Valpaços” como um Homem «dedicado a causas sociais, muito considerado pelos seus conterrâneos». Ninguém realçou mais, até hoje, as qualidades deste homem do que estes dois autores.


Nasceu em 5.11.1838 em Fiães, actual freguesia do concelho de Valpaços, no distrito de Vila Real. Foi filho de Luís António Fernandes e de Benedita de Almeida, ambos naturais da mesma freguesia de Fiães. Em 19.10.1859 casou na sua terra natal com Mariana da Conceição Videira, filha de Manuel José Videira, natural da vizinha freguesia de Lebução, e de Balbina Fernandes.
Foi popularmente conhecido como o “Miguel de Fiães” dentro e fora dos limites do concelho de Valpaços.
Criou-se, a dada altura, a seu respeito uma irónica frase epitética que, despida da evidente ironia que lhe está subjacente, pode servir para resumir, grosso modo, a vida de “Miguel de Fiães”: “era lavrador e não lavrava, contador e não contava, administrador e não administrava”. Na verdade, Miguel Francisco Fernandes Machado foi figura de grande prestígio no concelho de Valpaços devido à sua formação cultural, às suas aptidões para o exercício de importantes cargos públicos e administrativos, à excepcional argúcia que sempre revelou no ambiente político-partidário valpacense em que se impôs e ao sucesso que obteve nos seus empreendimentos agrícolas em Fiães.
Em 22.02.1883 foi nomeado, por Carta régia de D. Luís I, Contador e Distribuidor do Juízo de Direito da Comarca do Porto e, em 23.01.1885, por apostila do mesmo monarca àquela carta, obteve a transferência no exercício das mesmas funções para a Comarca de Valpaços. Mais tarde assumiu a liderança do Partido Regenerador de Valpaços que se encontrava vaga desde a morte de Filipe José Vieira. Usando da sua influência e simpatia, conseguiu obter uma larga base de apoio ao eleitorado do referido partido em todo o concelho, sobretudo entre o clero e as mais importantes famílias da aristocracia, dando-lhe renovado fôlego e fazendo renascer as esperanças das forças regeneradoras face à crise evidenciada nas suas fileiras durante cerca de uma década.
Em 1895, Miguel Machado exercia cumulativamente as funções de contador da comarca de Valpaços, administrador do concelho e chefe do Partido Regenerador quando uma inconcertada manobra eleitoralista cometida por uma das mais prestigiadas figuras do mesmo partido inflamou os ânimos dos seus correligionários valpacenses e deu origem à delicada questão conhecida por “Guet – Apens” de Valpaços. Este lamentável dissídio começou com o facto de António Teixeira de Sousa, então Governador Civil de Bragança, procurador à Junta Geral do distrito de Vila Real pelo concelho de Alijó, 1.º Secretário da Câmara dos Deputados e que naquele ano integrava a lista do mesmo Partido Regenerador do Distrito de Vila Real e vinha sendo eleito pelo círculo de Alijó, ter obtido do Governo de Hintze Ribeiro, em conformidade com a lei eleitoral aprovada no mesmo ano de 1895, o decreto que por determinação régia elevou Murça a comarca e integrou nela as freguesias de Curros, Jou e Vales, subtraindo-as do concelho e comarca de Valpaços. Gorados os instantes apelos dirigidos por Miguel Machado ao Ministro da Justiça no sentido de que não fosse dado provimento àquela decisão, chegando a deslocar-se debalde a Lisboa para renovar o pedido, e perante as vozes de indignação que se levantavam entre forças vivas de Valpaços das duas formações partidárias, o líder dos Regeneradores de Valpaços substitui o nome de Teixeira de Sousa pelo de António Lobato na lista distrital do seu Partido para as eleições. Este acto custou a Miguel Francisco Fernandes Machado a sua imediata demissão por determinação emanada do próprio gabinete do Ministro do Reino, João Franco. A questão gerada em torno do “Guet – Apens” de Valpaços alimentou longa polémica entre os dois protagonistas que a imprensa regional, e até nacional, deu cobertura. Miguel Machado é autor de um curioso opúsculo publicado em 1896, a expensas próprias, onde se propõe esclarecer o lamentável caso, opúsculo esse intitulado “O ataque do Sr. Teixeira de Sousa – A Minha Defesa” a que se dá especial relevo na já referida obra editada em 2010 pela Câmara Municipal de Valpaços da autoria do Dr. José António Soares da Silva.
Também se extrai desta mesma obra que em 12.10.1895 Miguel Machado contribuiu com 81 000 réis para a “Instituição de Socorro”, sociedade de beneficência laica criada e constituída por Joaquim de Castro Lopo e outras figuras gradas do Partido Progressista, o mais alto donativo então recebido pela mesma sociedade e, apesar das diferenças partidárias, em sessão especialmente realizada pela sociedade para tratar deste “donativo importante”, foi deliberado que se exarasse um voto de agradecimento a ele destinado e que o seu nome fosse inscrito no registo dos sócios da instituição.
Em 24.06.1897, ainda apesar das diferenças partidárias, na Assembleia Geral da Confraria de Nossa Senhora da Saúde, instituição entretanto criada pelo Partido Progressista, o nome de Miguel Francisco Fernandes Machado foi proposto para fazer parte da Comissão Promotora das obras da respectiva capela, o qual aceitou na sessão realizada no dia seguinte por esta mesma comissão e mais subscreveu o mesmo donativo de 60 000 réis declarados por outros membros inscritos no topo da mesma lista, depois de já ter contribuído antecipadamente para esta instituição com a quantia de 20 000 réis.
Na sessão realizada no dia 1 de Maio de 1898 pela assembleia Confraria de Nossa Senhora da Saúde foi deliberado atribuir-se-lhe o título de Irmão Benemérito.
Em 1909 foi mais uma vez administrador do concelho de Valpaços, no mesmo ano em que surgem referências documentais a seu respeito, destacando-o como exportador de batata e castanha em Fiães – afinal, o mesmo “lavrador que não lavrava”!
Em 1915, já em plena República, volta a ser administrador do concelho de Valpaços.
Existem ainda vagas referências de que, em qualquer momento da sua vida, Miguel Francisco Fernandes Machado terá sido “um dos directores da Companhia de Gás de Lisboa” ou “Administrador da Companhia Lisbonense de Iluminação a Gás”.
Faleceu em 30.06.1916.

terça-feira, 19 de abril de 2011

505.º Aniversário do Massacre dos judeus de Lisboa

Por Leonel Salvado

Uma das duas únicas gravuras sobreviventes ao terramoto de 1755 e ao incêndio da Torre do Tombo: “Da Contenda Cristã, que recentemente teve lugar em Lisboa, capital de Portugal, entre cristãos e cristãos-novos ou judeus, por causa do Deus Crucificado| http://pt.wikipedia.org

Trata-se de um dos mais dramáticos e delicados acontecimentos da História de Portugal, também designado por “Matança da Páscoa de 1506”, de que não se faz eco a memória colectiva do povo português, não se encontra a justa referência nos manuais escolares de História existentes, em qualquer dos níveis de escolaridade, e continua a ser, desde há cinco séculos, um “pedaço de História” que merece a atenção de um círculo muito restrito de historiadores. A Historiografia situa o início do vergonhoso massacre no dia 19 de Abril de 1505. Só a 23 de Abril de 2008 foi erguido em Lisboa, no Largo de S. Domingos, próximo do Convento desta ordem, onde teve início o triste evento, um monumento em homenagem aos judeus mortos em 1506 nesta cidade.

Monumento em homenagem aos judeus vítimas do massacre de 1506, Lisboa | foto: SergioPT | http://pt.wikipedia.org
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A cinco séculos de distância, este monumento que se transformou em ponto de encontro de estrangeiros encontra-se, ironicamente, perto de um outro monumento em homenagem ao catolicismo e de um mural onde a frase “Lisboa, cidade da tolerância” pode ser lida em 34 línguas.


Os antecedentes

A 23 de Março de 2011 publicámos aqui no Clube de História de Valpaços um artigo que entendemos ser de interesse e relevância local e regional dedicado à “Expulsão dos judeus de Castela e o reforço das comunidades criptojudaicas em Trás-os-Montes”. Ora, uma grande parte dos cerca de 90 000 judeus entrados em Portugal em consequência da sua expulsão pelos reis católicos, Isabel de Castela e Fernando de Aragão, através do “decreto de Alhambra” de 31 de Março de 1492, permaneceram no reino, sob as condições impostas pelo monarca português, D. João II, nos termos a que nos referimos no artigo atrás mencionado, estabelecendo-se um prazo de oito meses para que os que não respeitassem essas condições abandonassem o reino. Desde então, e posto que em alguns lugares a população aceitou mal a clemência régia e constatando-se ainda que muitos judeus não possuíam condições financeiras para embarcar, o que os levava a simular a conversão para serem poupados a afrontas e punições, o monarca recorreu à conversão forçada de modo a pôr termo à onda de agitação social que já se sentia agravar-se contra eles. Começavam então as bárbaras provações por que passaram as famílias judaicas a quem se apartavam, à força, os filhos menores para serem baptizados e conduzidos à ilha de S. Tomé, onde se fariam bons cristãos e povoadores, longe da influência da doutrina mosaica e da língua e cultura hebraicas. Este procedimento “considerado bárbaro à luz do nosso tempo” levou o historiador Joaquim Veríssimo Serrão, na esteira de outros historiadores, a tecer a seguintes comentários:

“A odisseia dos judeus que constitui uma página negra da história ibérica dos fins do século XV, serviu de tema a Samuel Usque para a dolorosa evocação do sofrimento dos seus irmãos de raça. O ressentimento secular dos cristãos está longe de justificar o clima de intolerância que então dominou o País e que foi apenas e que foi apenas o prólogo de violências ainda mais cruéis que no tempo de D. Manuel viriam a atingir a raça proscrita.”

J. V. Serrão, História de Portugal, Verbo, 3ª ed. revista, 1980, vol II, p. 262

De facto, foi já no reinado de D. Manuel que a situação se complicou para as comunidades judias por força não da sua vontade pessoal (no início do seu reinado D. Manuel adoptara uma política de grande tolerância em relação aos judeus, chegando a conceder a liberdade aos que haviam recaído para a condição de escravos por vontade de D. João II) mas do compromisso a que se vira obrigado devido ao seu casamento com D. Isabel de Aragão em 1497 nos termos de cujo contrato os judeus eram considerados “hereges”, e, sobretudo após o seu casamento, no ano seguinte, com D. Maria de Aragão, posto que foi em cumprimento de uma das cláusulas deste segundo matrimónio que “o Venturoso” requereu a instalação da Inquisição em Portugal, a qual só viria a ser autorizada por decisão papal em 1531, anulada um ano depois e restabelecida, a pedido de D. João III, em 1536.  

Ainda que com grande hesitação, dado o parecer dos seus conselheiros de que a saída dos judeus empobreceria o corpo social da Nação (J. V. Serrão, ob. Cit., Id), logo no ano de 1497, D. Manuel estabeleceu o prazo de Janeiro a Outubro para que os não convertidos abandonassem o Reino, mas ordenou também que fosse dada continuidade à prática iniciada pelo seu antecessor para que àqueles fossem tirados os seus filhos com idade inferior a catorze anos, espalhados pelo País e levados ao baptismo. Ordenou ainda a condução forçada de muitos outras famílias para Lisboa, onde foram forçados ao baptismo, o que deu origem ao conceito de “cristão-novo” e ao estigmatismo que logo se lhe associou. Tal foi a ardilosa solução encontrada pelo monarca, tantas vezes sublinhada pelos historiadores, para que, sem aparente despeito pelo compromissos diplomáticos e matrimoniais assumidos com o reino vizinho, pudesse evitar a saída dos Judeus do Reino e assim manter a sua prosperidade que, como se sabe, era em grande parte assegurada pelas imensas fortunas e dinamismo económico e comercial de que eram detentores os “cristãos-novos”, sobretudo em Lisboa, então um dos principais centros cosmopolitas da época. Foi também nesse sentido que a 30 de Maio de 1498 foi aprovada a medida régia que estabelecia um prazo de vinte anos para que os judeus conversos não fossem molestados pelos cristãos. Porém, estas medidas não sortiram o efeito desejado devido à inabalável desconfiança da população perante os “cristãos-novos”, acusados de continuar secretamente a praticar o seu culto ancestral tanto em família como em comunidade, o que na maioria dos casos correspondia à verdade. Parafraseando o já citado historiador Joaquim Veríssimo Serrão (Ob. Cit. Vo lIII, p. 17), não se confirmou, como a coroa pensava, “que o tempo seria condição bastante para o apaziguamento social que se impunha.”


O Massacre e suas consequências

Existem indicadores de que por todo o País surgiam pequenos conflitos entre as comunidades de cristãos e conversos ou pseudoconversos. Mas foi em Lisboa, na Pascoela de 1506, que a situação se tornou mais grave, transformando-se num movimento insurreccional contra os judeus que durante três dias ceifou a vida a cerca de 2000 pessoas, segundo o cômputo indicado por Alexandre Herculano em Da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal e subscrito por Veríssimo Serrão (Ob. Cit., Vol. 3, p.18). Uma tragédia originada pela explosão da recalcada animosidade da população lisboeta, despoletada por um pequeno incidente e alimentada pela adesão aos amotinados de alguns nautas estrangeiros de passagem pela cidade e pela incitação à violência por dois frades dominicanos. Uma das descrições mais próximas do tempo em que sucedeu este arrepiante acontecimento, para além da de Garcia de Resende, é a que nos legou Damião de Góis na “Chronica do Felicissimo Rey D. Emanuel da Gloriosa Memória”. Conta-nos este cronista quinhentista:

«No mosteiro de São Domingos da dita cidade estava uma capela a que chamava de Jesus, e nela um crucifixo, em que foi então visto um sinal, a que davam cor de milagre, com quanto os que na igreja se acharam julgavam ser o contrário dos quais um cristão-novo disse que lhe parecia uma candeia acesa que estava posta no lado da imagem de Jesus, o que ouvindo alguns homens baixos o tiraram pelos cabelos de arrasto para fora da igreja, e o mataram, e queimaram logo o corpo no Rossio. Ao qual alvoroço acudiu muito povo, a quem um frade fez uma pregação convocando-os contra os cristãos-novos, após o que saíram dois frades do mosteiro, com um crucifixo nas mãos bradando, heresia, heresia, o que imprimiu tanto em muita gente estrangeira, popular, marinheiros de naus, que então vieram da Holanda, Zelândia, e outras partes, ali homens da terra, da mesma condição, e pouca qualidade, que juntos mais de quinhentos, começaram a matar todos os cristãos-novos que achavam pelas ruas, …tirando-os delas de arrasto pelas ruas, com seus filhos, mulheres, e filhas, os lançavam de mistura vivos e mortos nas fogueiras, sem nenhuma piedade, e era tamanha a crueza que até nos meninos, e nas crianças que estavam no berço a executavam, tomando-os pelas pernas fendendo-os em pedaços, e esborrachando-os de arremesso nas paredes. …tornaram terça-feira este danados homens a prosseguir a sua crueza, mas não tanto quanto nos outros dias porque já não achavam quem matar, pois todos os cristãos-novos que escaparam desta tamanha fúria, serem postos a salvo por pessoas honradas, e piedosas que nisto trabalharam tudo o que neles foi.»

In http://pt.wikipedia.org

Sabemos pelo mesmo Damião de Góis das medidas de justiça régia sobre os implicados no motim e das consequências que daí resultaram nas relações sociais entre as duas comunidades, através das seguintes palavras de Veríssimo Serrão:

Logo que soube do «alevantamento», D. Manuel, que se encontrava em Avis a caminho de Beja, mandou a Lisboa o Prior do Crato e o barão de Alvito com amplos poderes para punir os culpados. Os chefes do motim, em número de 50, receberam o castigo da forca, sofrendo os dois religiosos a pena do garrote. Por carta régia de 22 de Maio retirou-se à capital uma parte dos seus antigos privilégios, destituíram-se funcionários, levantou-se devassa a outros e suspenderam-se as eleições na Casa dos Vinte e Quatro, numa forma de exemplar condenação do bárbaro crime de que Lisboa fora teatro. A culpa do malefício recaía também sobre os «outros moradores & da dita cidade e termo della» que não se tinham oposto aos «muitos insultos & danos» que ensanguentaram a capital.”

Joaquim V. Serrão, Ob cit., Vol. III. pp. 18-19

Tais medidas foram de molde a abrir um ambiente de maior tolerância em relação aos judeus, concedendo-se-lhes a possibilidade de abandonar o Reino por sua livre vontade com todos os seus haveres e proporcionando aos que ilegalmente se ausentaram a oportunidade de regresso sem qualquer castigo. Sobrevindo a bonança obteve-se a reconciliação, visto que a maior parte deles decidiu permanecer em Portugal e foi reposta a paz religiosa até ao final do reinado de D. Manuel. Com a subida ao trono de D. João III repetiu-se a cisão entre cristãos e conversos e agravou-se o ressentimento secular dos cristãos a que Joaquim Veríssimo Serrão aludiu no primeiro excerto que dele transcrevemos neste post. A amargurada odisseia dos judeus  em Portugal ainda estava bastante longe do seu termo.

domingo, 17 de abril de 2011

Os Cruzeiros do concelho de Valpaços – Freguesia de Santa Valha

Padre João Parente (trancrição)
I
A
Cruzeiro do Senhor da Boa Morte, Santa Valha em 2004
 | Foto base: Padre João Parente, 2004 | Pseudo-azulejos (adaptação Leonel Salvado)
(clique sobre a imagem para aumentá-la)

Número: 12.16. 231

Local: Santa Valha num outeiro, à saída da aldeia em direcção ao sul
Título: Senhor da Boa Morte
Material: Granito, ferro e telhado de madeira
Altura: 3,50 m, base e cruz
Descrição: Dentro de alpendre de três paredes, uma fundeira e duas laterais, resguardado por grades de ferro, aconchega-se o simples cruzeiro constituído por base cubóide e cruz simples, com o crucifixo policromado e a legenda, no fuste: “S. B / MORTE”.
Data: Século XIX [plataforma e escadaria de construção recente]

Fonte: Padre João Parente, Os cruzeiros da Diocese de Vila Real, Produção Media Line, Impresse 4, sd, p. 287.

B
 Cruzeiro do Senhor da Boa Morte na actualidade, Santa Valha
 | Foto base: Junta de Freguesia de Santa Valha | http://www.santavalha.com
 | Pseudo-azulejos (adaptação Leonel Salvado)
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II
A
Cruzeiro da capela do Senhor da Boa Morte, Corgoço, Santa Valha
 | Foto base: Padre João Parente, 2004 | Pseudo-azulejos (adaptação Leonel Salvado)
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Número: 12.18.232

Local: Corgoço, Freguesia de Santa Valha
Título: Cruzeiro
Material: Granito e ferro
Altura: 3,50 m, base e cruz
Descrição: Dentro de pequena capela de granito, com portas de ferro, sobre uma base de cimento, resguarda-se a cruz de granito pintado de azul que sustenta o crucifixo de madeira policromada.
Data: Século XIX – XX

Fonte: Id. p.288.
 B
A capela do Senhor da Boa Morte, Corgoço, Santa Valha
 | Foto base: Junta de Freguesia de Santa Valha http://www.santavalha.com
 | Pseudo-azulejos (adaptação Leonel Salvado)
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Outros Cruzeiros da Freguesia de Santa Valha

Cruzeiro ao caminho de Vale Bem Feito
 | Foto base: Junta de Freguesia de Santa Valha http://www.santavalha.com
 | Pseudo-azulejos (adaptação Leonel Salvado)
(clique sobre a imagem para aumentá-la)



Cruzeiro chamado de Cruz de Santa Olaia, Santa Valha
 | Foto base: Junta de Freguesia de Santa Valha http://www.santavalha.com
 | Pseudo-azulejos (adaptação Leonel Salvado)
(clique sobre a imagem para aumentá-la)




Cruzeiro conhecido por Cruz de PardelinhaPardelinha, Santa Valha
 | Foto base: Junta de Freguesia de Santa Valha http://www.santavalha.com
 | Pseudo-azulejos (adaptação Leonel Salvado)
(clique sobre a imagem para aumentá-la)